O avanço das neurociências tem possibilitado uma maior compreensão sobre a relação da música e o sistema nervoso. Através das técnicas de neuroimagem(IRM) é possível verificar as diferentes estruturas cerebrais e os efeitos neuroplásticos resultantes da audição, canto e treinos musicais.

Pois bem, a música realiza o milagre de criar um mundo melhor no qual a dor dos dias tristes é inevitável.  O som e a música nos fazem sentir emoções e isso muda nossa fisiologia, hormônios, alterna nosso ritmo cardíaco e nosso pulso.

As áreas do cérebro que se ativam com emoções e música são praticamente as mesmas. Quando o cérebro percebe ondas sonoras, certas reações psicofisiológicas ocorrem. Os estímulos  sonoros caminham pelo nervo auditivo e chegam ao lobo temporal, onde se dá a senso-percepção musical. Por sua vez o lobo temporal se conecta ao hipocampo – área ligada à memória – a amígdala e o cerebelo – um núcleo relacionado ao bem-estar e o outro responsável pela regulação motora gerando interações auditivo-motoras. Estas interações por exemplo produz efeitos como o Feedfoward relacionado à capacidade do indivíduo prever eventos – somos capazes de bater o pé no ritmo de uma música porque percebemos a regularidade  através do estimulo auditivo e prevemos/sincronizamos o movimento dos pés com a música. Por esse motivo, respondemos com emoções e estas causam alterações fisiológicas, como o aumento da secreção de neurotransmissores e outros hormônios que atuam no sistema nervoso central.

Hoje recorremos à música, em face da guerra desencadeada por uma criatura invisível e maligna, a Sars-Cov-2, mais conhecida como Covid-19 ou novo coronavírus.

Ressoa nas varandas e janelas da Itália: todo mundo canta e toca aquilo que ama, porém se sente conectado aos outros por um relacionamento próximo e mútuo.

É compreensível, pois a música alimenta o senso de comunidade social, organiza emoções e pode exercer uma ação consoladora.

Hoje, diante da angústia gerada por um perigo invisível, atualmente considerado incontrolável, a música se torna um meio de sobrevivência.  O uso se torna taumatúrgico.

Em nossa cultura, fazer música está intimamente relacionado à escuta.  Se você ouvir, significa que você presta atenção, percebe.

Tocando ou cantando – sozinho ou em grupo – é estabelecida uma relação entre intérpretes e ouvintes: o sentimento de solidariedade, simpatia e comunicação que a criatura malévola devasta é reconstruído.

Não importa se você é afinado ou desafinado, profissional ou dedilhado, o som e o canto produzem uma corrente sentimental que faz você se sentir forte e coeso.

E assim, apesar da variedade de gêneros musicais, o inimigo está melhor enfrentado.

Franz Schubert – em 1817 – escreveu uma maravilhosa Lied, “An die Musik”, em oito versos de seu amigo Franz von Schober.

Transcrevo alguns deles:

“Você, arte gentil, em quantas horas desoladas

você acendeu meu coração ao calor do amor

e você me levou com você para um mundo melhor!

Doce arte, obrigado por isso! ”

(Du, holde Kunst, in wieviel grauen Stunden | Hast du mein Herz zu warmer Lieb ‘entzunden, | Hast mich in eine beßre Welt entrückt! | Du holde Kunst, ich danke dir dafür!).

Ouça, dura três minutos e é maravilhosamente benéfico.

Referências:

  • LEVITIN, D.J;  TIROVOLAS, A.K. Current advances in the cognitives neuroscience of music. Annais of the New York Academy of Sciences, v.1156, 2009
  • VOGT, S;  BUCCINO, G; WOHLCHLÄGER, A.M; CANESSA, N; ET. AL., Prefrontal Involvement in imitation learning of hands actions; Effects of practice and expertise. NeuroImage, v. 37, 2007
  • ZATORRE, R.J; BELIN P.; PEHUME, V.B; Structure and function of auditory cortex: music and speech. trends in cognitive Sciences, v.6, 2002